Opinião Pessoal (XXXII)

Artigo de opinião publicado no “Diário de Notícias” 17 julho 2024

Continuo o tema VIH/SIDA.

A partir de 1981, multiplicaram-se os casos de doentes graves com síndromes que refletiam fragilidade da imunidade (que fora adquirida sem se perceber a razão).

Se é verdade que os quadros clínicos traduziam a fraqueza do sistema imunitário (que deixara de proteger o organismo de infeções e de cancro) é preciso, também, realçar que a sua causa era, então, inteiramente desconhecida. Uma incógnita surpreendente. Inesperada. Imprevisível.

A primeiríssima preocupação era descobrir se essa nova síndrome seria uma infeção transmissível de pessoa a pessoa e, se assim acontecesse, como se transmitia.

Para criar estratégias de prevenção na perspetiva de poder ser evitada essa infeção era preciso ter resposta à questão: quais os modos de transmissão?

As pesquisas conduzidas em múltiplos centros científicos, sob coordenação da Organização Mundial da Saúde (OMS), iniciaram-se, desde logo. Para tal, foi criado um programa especial que juntou investigadores, médicos, biólogos e epidemiologistas, designadamente europeus e norte-americanos.

Poucos meses depois, percebeu-se que os novos casos estavam associados a relações sexuais, tal e qual como 100 anos antes acontecera com a sífilis.

Também cedo se reconheceu a possibilidade do sangue transmitir a síndrome (através de transfusões ou da utilização comum de objetos cortantes ou perfurantes, por exemplo), bem como das mães doentes poderem transmitir aos filhos durante a gravidez, o parto ou a amamentação (transmissão mãe-filho).

Estabeleceram-se, assim, três vias de transmissão: 1 relação sexual; 2 pelo sangue; 3 da mãe para o filho.

As investigações epidemiológicas da OMS demonstraram, inequivocamente, que os mosquitos não transmitiam esse agente. Se assim sucedesse, isto é, se a picada de mosquito tivesse a possibilidade de transmitir o agente da nova síndrome então tudo teria sido diferente porque ninguém pode evitar a picada de mosquitos (a não ser que viva com fatos de astronauta).

Se, como a febre amarela, o dengue ou o paludismo, os mosquitos fossem capazes de transmitir o novo agente as consequências teriam sido ainda mais devastadoras. Mas, a impossibilidade dessa hipótese foi verificada: a frequência da nova síndrome identificada na população não apresentava diferença em função da densidade de mosquitos existente nas várias regiões investigadas (como os mosquitos multiplicam-se na água, a síndrome teria que ser mais frequente junto dos rios e lagos, em comparação com zonas áridas).

A notícia que confirmou a impossibilidade dos mosquitos transmitirem o “agente mistério” foi logo festejada em jantar especial no Hotel 24 de Setembro de Bissau.

(continua)

Francisco George
franciscogeorge@icloud.com