Opinião Pessoal (XXVIII)

Artigo de opinião publicado no “Diário de Notícias” 19 junho 2024

Sou daqueles que gosto de conhecer a História do nosso país porque admito que a interpretação da realidade presente está, inevitavelmente, associada à evolução de eventos passados relativos a múltiplas dimensões (culturais, sociais e económicas).

Ora, Portugal foi fundado, há 881 anos, em ambiente de sucessivas batalhas havidas contra Leão, Castela e os Mouros. A ambição, a audácia e a espada de Afonso Henriques foram decisivas para ter sido reconhecido como rei de Portugal por Afonso VII de Leão e Castela, em 1143. Foi inaugurada, assim, a primeira dinastia portuguesa até à coroação de João, Mestre da Ordem de Avis, em 1385.

Afonso Henriques nascera em Guimarães, em 1111, era filho de Henrique de Borgonha e de Teresa de Leão (titulares do condado Portucalense). Muitos historiadores descrevem a personalidade de Afonso Henriques caracterizada por espírito insubmisso, pela sua rebeldia e pelo ânimo inquieto (como escreveu Alexandre Herculano).

Em 1146, Afonso Henriques casou com Matilde de Saboia (1125-1158) que, curiosamente, entre nós, é mais conhecida como Mafalda. A primeira rainha de Portugal durante a sua curta vida (33 anos) teve sete descendentes. O quinto a nascer foi Sancho (1154-1211) que viria a suceder a seu pai, em 1185, como segundo rei.

Como se sabe, o novo reino ergueu-se de batalha em batalha, de conquista em conquista.  A expansão territorial alcançada viria a completar o nosso atual retângulo até às praias algarvias. Neste âmbito, em 1147, a tomada de Lisboa aos mouros, após um cerco de cinco meses, representou um notável marco. Para tal, Afonso Henriques teve o apoio de cruzados ingleses que estavam em Portugal a caminho da Terra Santa (Palestina).

Afonso Henriques morreria em 1185, em Coimbra. Todo o seu reinado foi assinalado por constantes guerras: ora contra cristãos leoneses e castelhanos ora para expulsar os muçulmanos. Antes e depois de ser rei foi sempre um temido guerreiro. A administração do país que criou foi sendo adiada porque, para ele, era preciso, primeiramente, ganhar as lutas e os combates. Conquistar era a sua grande prioridade.

A sua vida de combatente destemido e ousado foi um fascínio.

Quando eu passava em Coimbra, sobretudo na altura das minhas deslocações oficiais, tinha o costume de parar na baixa para visitar o túmulo de Afonso Henriques no Mosteiro de Santa Cruz. Este tributo que gostava de prestar gerava no meu pensamento uma estranha emoção que nunca consegui nem explicar nem conter. Os poucos momentos que aí estava eram suficientes para idealizar a imensa energia que o nosso primeiro monarca terá conseguido mobilizar para construir o novo Estado.

Sobre Afonso Henriques gosto especialmente dos versos, em duas quadras, que Fernando Pessoa nos deixou na “Mensagem”, publicada em 1934:

Pai, foste cavaleiro.
Hoje a vigília é nossa.
Dá-nos o exemplo inteiro
E a tua inteira força!

Dá, contra a hora em que, errada,
Novos infiéis vençam,
A bênção como espada,
A espada como bênção!  

Conclusão: Em próxima deslocação a Coimbra aconselho os leitores a visitarem o Mosteiro de Santa Cruz, edificado em 1131 por iniciativa dos dois primeiros reis. Os túmulos de Afonso Henriques e de seu filho Sancho aí se encontram por vontade expressa deles.

(continua)

Francisco George
franciscogeorge@icloud.com